Mistérios ocultos
O que leva o incrédulo a não aceitar as verdades espirituais? O que o faz manter-se impermeável a certas doutrinas espiritualistas? De onde vem a dificuldade para aceitar a doutrina espírita, por exemplo, já que os princípios universais que esta declara existem desde sempre; não foram conjecturados para formar mais uma filosofia, dentre tantas, mas consolidar ideias e práticas aceitas milenarmente em muitos lugares e por várias civilizações.
Uma pessoa do meu convívio, que não chega a ser
ateia, mas reluta sistematicamente em concordar com os argumentos espíritas, me
disse que entende Deus como uma grande incógnita, um profundo mistério, acima
das nossas pobres cogitações humanas, por isso não cuida Dele.
Com esse viés de incredulidade, ela se recusa a
aceitar explicações que não sejam obtidas pela metodologia da ciência acadêmica
que, como não é difícil compreender, é inadequada para aferir resultados de
causa espiritual.
Em casos como este é inútil se pensar no argumento
de Tomé: “É preciso ver para crer”, pois “ver”, para a maioria dos incrédulos,
não muda suas concepções. Também não é possível se dizer o que Deus deve fazer
para superar a sua incredulidade, pois Deus não se submete a quaisquer
exigências ou imposições. Apenas “ouve com bondade os que o procuram
humildemente, e não os que se julgam mais do que Ele”.
A compreensão das questões transcendentais que
envolvem o problema de Deus, do ser e das leis divinas, parece não depender só
da inteligência, pois muitas pessoas preparadas intelectualmente costumam
rejeitar as respostas obtidas com a ajuda do conhecimento espiritual.
Allan Kardec afirma que essa compreensão é bastante
facilitada e mais completa com o desenvolvimento do senso moral no indivíduo
(1), o que lhe permite entender, sem esforço, a preponderância do elemento
espiritual e suas leis específicas sobre o elemento material, que lhe é
subalterno e coadjuvante.
Sobre a questão de muitas pessoas terem dificuldade
em aceitar as verdades espirituais, assimiladas tão naturalmente por tantas
outras, há n’O Evangelho segundo o Espiritismo um comentário de Kardec
esclarecendo um texto do evangelista Mateus (XI: 25): Mistérios ocultos aos
sábios e prudentes.
Nele, o codificador afirma que Deus jamais oculta a
luz da verdade a nenhuma criatura, ao contrário, a espalha prodigamente por
toda a face da Terra. Explica que a inteligência no mundo, quase sempre, está
associada ao orgulho e à vaidade que, normalmente, levam o homem a supor-se autossuficiente,
satisfeito em buscar os segredos da Terra, que para ele bastam, pondo assim,
uma venda nos próprios olhos.
Enquanto os vícios morais impedem o orgulhoso de
“ver”, o simples e humilde pode, com as virtudes conquistadas, desvendar os
segredos do Céu.
Portanto, são dois sentimentos antagônicos —
orgulho e humildade — que situam os seres em níveis diferentes de compreensão,
e que os colocam mais ou menos próximos do ideal de verdade, proposto por Jesus
de Nazaré e ratificado pelo Espiritismo.
Os que já detêm a sabedoria do Céu continuarão se
aprimorando, com a amplitude de vistas que esse conhecimento lhes faculta. Os
que se contentam com as razões do mundo precisarão amadurecer para compreender,
e preparar o coração para sentir.
Deus, que não quer abrir os seus olhos à força, os
aguardará, enquanto lutam contra o próprio orgulho, até que passem a reconhecer
Nele a mão que os governa.
(1) Allan
Kardec, O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo XVII, Os bons espíritas.
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